segunda-feira, agosto 14, 2006

Bertolt Brecht

Sobre o pobre B.B.

Eu, Bertolt Brecht, sou das florestas negras.
Minha mãe me trouxe para as cidades
Dentro do ventre. E o frio das florestas
Estará comigo ao me cobrir a laje.

Na cidade de asfalto estou em casa e a caráter,
Com todos os últimos sacramentos
Ministrados: jornais, tabaco, conhaque:
Desconfiado, indolente e enfim satisfeito.

Sou amável com os outros. E visto
Meu chapéu-coco, como todo o mundo.
Digo: são bichos de cheiro esquisito
E digo: e daí? Também sou, no fundo.

Às vezes, nas cadeiras de balanço,
Coloco algumas moças, de manhã,
E digo: em mim vocês têm, eu garanto,
Alguém em quem não podem confiar.

À tarde me reúno com colegas.
Tratamo-nos de “gentleman”, então.
Eles dizem, com os pés à minha mesa:
As coisas vão melhorar. E não pergunto: quando.

Na madrugada cinza, abetos mijam
E piam os pássaros, que são seus vermes.
Na cidade, meu copo se esvazia,
Largo o charuto e durmo um sono leve.

Assentamo-nos, uma geração leviana,
Em prédios que quiséramos indestrutíveis
(assim construímos os arranha-céus da ilha de Manhattan
E as finas antenas sobre o Atlântico a nos divertirem).

Destas cidades ficará quem as atravessou, o vento!
A casa faz feliz quem nela come: quem a esvazia.
Sabemos sermos efêmeros
E que depois de nós o que virá será sem valia.

Nos terremotos vindouros, que não seja meu fado
Deixar por amargura o meu Virginia se apagar,
Eu, Bertolt Brecht, largado nas cidades de asfalto,
Oriundo das florestas negras, no ventre da mãe, tempos atrás.

Tradução: Antonio Cícero

domingo, agosto 06, 2006


Da viagem traz-se essas duas fotos e um poema do Keats, esse aí abaixo:


Depois da bruma ter atravessado estas planícies
por uma triste, longa estação, ergue-se um dia
nascido no aprazível sul, que vem purificar
o doentio céu de todos os seus estigmas.

O mês ansioso, livre do sofrimento,
mais uma vez se nutre das sensações de maio,
e, frescas, são as pálpebras como folhas
das rosas tocadas pelas chuvas de estio.

Calmos pensamentos nos cercam, como florir
dos ramos... os frutos a amadurecer.. o sol de outono
que há pouco sorria sobre as colheitas abandonadas...

o frágil rosto de Safo... o respirar feliz de uma criança...
a areia de um instante que desliza serenamente...
um rio a atravessar o bosque... a morte de um poeta...